Todo católico conhece a oração “Salve, Rainha”, porém, nem todos sabem que ela foi modificada de uma vez por todas por um grande santo, cuja festa celebramos hoje: São Bernardo de Claraval.
No início do séc. XI, um monge beneditino chamado Hermann de Reichenau compôs o texto da Salve Regina. Essa oração rapidamente se difundiu nos mosteiros da Europa, especialmente nos beneditinos e cistercienses.
Certa vez, ouvindo a Salve Regina na catedral de Espira, ouviu-se São Bernardo exclamar: “Ó clemente, ó piedosa, ó doce Virgem Maria”, palavras com as quais desde então se conclui essa bela antífona à Santa Virgem no Ofício do Breviário.
É também atribuída a este santo a autoria da oração "Lembrai-Vos" (Memorare), oração tocante, com a qual um santo padre do século XVII, Claude Bernard, realizou grandes milagres.
Bernardo nasceu em 1091, no castelo de Fontaine, perto de Dijon (nordeste da França). Seu pai se chamava Tescelin, cavaleiro feudal da Borgonha, e sua mãe, Alix de Montbard, mulher piedosa, caridosa e ideal de castelã cristã.
Nosso santo foi educado pelos cônegos de Châtillon-sur-Seine, onde se encantou com a poesia latina e teve sua primeira experiência mística: a visão do Menino Jesus no Natal.
Num vale solitário chamado Cîteaux, entre a Borgonha e a Bresse, monges reformados de Cluny fundaram, em 1098, um mosteiro sob a direção de São Roberto de Molesme.
Eles seguiam com rigor a Regra de São Bento, em vida tão austera que assustava os visitantes. No ano de 1113, chegou São Bernardo, na época contando com 23 anos. Era um jovem de extraordinária beleza, acompanhado de trinta parentes e amigos.
A caminho do mosteiro, ele e seus irmãos avisaram ao pequeno irmão Nivardo que este seria agora herdeiro de todas as posses, pois todos estavam abandonando o mundo.
A criança protestou: “Vocês ficam com o céu e me deixam a terra?” Pouco a pouco, toda a família seguiu para a vida religiosa.
São Bernardo abraçou uma austeridade extrema. Ele se perguntava: “Bernardo, o que vieste fazer aqui?” A resposta que ele mesmo se impôs era um programa assustador: “Aqui a carne não tem lugar!”
Tapava os ouvidos para evitar distrações, nunca fixava os olhos nas coisas exteriores, alimentava-se apenas de pão preto e legumes, dormia sobre palha, e trabalhava em tarefas humildes.
Por uma pequena falta, se jogou em uma água tão congelante, que quase morreu. Seu sacrifício foi agradável a Deus, que o livrou, a partir daquele momento, de qualquer tentação contra a pureza.
A abadia de Cîteaux crescia rapidamente e enviava grupos para fundar novos mosteiros. Em 1115, Bernardo e doze monges se instalaram em um vale que chamaram de Clara Vallis – Claraval.
As condições eram duríssimas: alimentação precária, camas rústicas, edifícios pobres. Mesmo assim, Claraval tornou-se foco de muitíssimas vocações. Sua exigência excessiva enfraqueceu sua saúde, obrigando-o a se retirar por um tempo.
Bernardo atraiu estudantes, nobres e cavaleiros. Quando sua irmã Humbelina visitou-o em trajes luxuosos; ele a repreendeu, e ela acabou tornando-se monja em Jully-les-Nonains. Seu pai Tescelin também vestiu o hábito em Claraval.
São Bernardo escreveu o Tratado da Humildade, Do Amor de Deus, Da Conversão dos Clérigos e numerosos sermões e cartas. Ganhou fama de conselheiro espiritual e árbitro político: orientava bispos, reis e até papas.
Combateu hereges e pensadores como Abelardo e Arnaldo de Bréscia. No cisma de 1130, apoiou Inocêncio II contra o antipapa Anacleto II, percorrendo a Europa para garantir reconhecimento. Converteu o duque Guilherme da Aquitânia, que se tornou santo.
Pregou ainda a Segunda Cruzada em Vézelay, inflamando reis e povos. Sua eloquência mobilizou França e Alemanha, mas, apesar do entusiasmo, a cruzada fracassou por divisões internas.
Morreu em Claraval, no dia 20 de agosto de 1153. Foi canonizado e proclamado Doutor da Igreja em 1174 pelo papa Alexandre III. Sua festa litúrgica foi elevada ao rito duplo por São Pio V e colocada em 20 de agosto pelo Papa Pio VIII.
Pe. Alban Butler. The Lives of the Saints, Benziger Bros, 1894.
Pe. João Batista Lehmann. Na luz perpétua. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 1953.