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O que é a Santíssima Trindade?

Doutrina
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16/6/2025
Equipe do Padre Leonardo Wagner

No Domingo após a oitava de Pentecostes, celebramos a Santíssima Trindade.

Deus Pai, ao refletir sobre Si mesmo, concebe-Se perfeitamente. Esse conhecimento de Deus sobre Si mesmo é a geração do Filho. 

Assim como nós temos um conceito de nós mesmos, Deus, que Se conhece perfeitamente, gera a Segunda Pessoa da Trindade por uma concepção perfeita de Si. 

Diferentemente de nós, cuja autocompreensão é distinta da nossa natureza humana, Deus, ao conhecer-Se perfeitamente, só poderia fazê-lo comunicando integralmente Sua natureza divina à Segunda Pessoa da Trindade.

A processão do Espírito Santo

Quando o Pai e o Filho se veem mutuamente, veem que são a própria bondade, e assim se amam

Esse amor é a inspiração ("spiratio", I pars, q. 30, a. 2) do Espírito Santo — o amor do Pai e do Filho um pelo outro. 

As três Pessoas da Trindade são realmente distintas entre si e, ainda assim, o mistério está no fato de que são perfeitamente uma só, pois partilham a mesma Essência Divina.

A ordem na Criação

Vemos a ação da Santíssima Trindade na história da Criação. No último Evangelho de cada Missa, ouvimos:

“Por Ele todas as coisas foram feitas, e sem Ele nada do que foi feito se fez.” 

Essa referência é ao Filho de Deus, que é o conhecimento que Deus tem de Si mesmo. Em outras palavras, Deus criou todas as coisas por meio de Seu conhecimento, razão pela qual toda a Criação tem ordem — pois a ordem é produto da inteligência

A referência nessa passagem é ao Verbo, e aqui vemos que, assim como concebemos interiormente uma palavra antes de dizê-la, Deus concebe-Se eternamente antes de nos revelar Sua natureza Trinitária.

A Segunda Pessoa também é chamada de Sabedoria em Si mesma, porque a sabedoria é a contemplação das causas mais elevadas das coisas

Deus, sendo a causa suprema de tudo, contempla a Si mesmo — e essa contemplação gera a Segunda Pessoa da Trindade: que é o conhecimento que Deus tem de Si.

Lemos no livro do Gênesis, sobre a Criação:

“No princípio, Deus criou o céu e a terra. A terra, porém, era informe e vazia, e as trevas cobriam o abismo, e o Espírito de Deus pairava-Se sobre as águas.” 

Muitos interpretam isso como significando que a Criação foi realizada por meio do Espírito Santo. Embora toda ação de Deus na criação seja feita pelas três Pessoas da Trindade (pois não podem ser separadas), certas ações são atribuídas mais a uma Pessoa do que a outra, devido à natureza da ação e sua conveniência a uma das Pessoas.

Deus nos criou por amor de Si mesmo

No caso da passagem de Gênesis, isso significa que a criação se deu pelo amor de Deus por Si mesmo — em outras palavras, Deus nos criou por amor a Si

Deus cria o homem à Sua imagem, como lemos em Gênesis. Alguns Padres da Igreja interpretam isso dizendo que, assim como Deus se conhece e é, portanto, inteligente, e Se ama e, portanto, tem vontade, o homem também possui inteligência e vontade livre. Essa é a principal maneira pela qual o homem se assemelha a Deus. Assim, vemos no homem um vestígio da própria Trindade.

Embora não possamos conhecer a Trindade por nossa própria natureza, ao conhecermos a Trindade, vemos como somos semelhantes a Deus.

A Trindade no Antigo Testamento

O período do Antigo Testamento consiste na lenta recondução do homem a Deus.

Durante esse tempo, Deus foca Suas ações em estabelecer dois princípios essenciais no entendimento humano:

  1. Que há um só Deus e nenhum outro, e que Ele é esse Deus.
  2. Que o homem deve seguir a vontade de Deus, obedecendo a tudo o que Ele ordena.

Embora a Trindade esteja implicitamente contida em certas revelações do Antigo Testamento, só com Cristo essa verdade se torna explícita. Em outras palavras, Deus escolheu não revelar durante o Antigo Testamento que Ele é Trino, provavelmente porque o homem não compreenderia como pode haver um só Deus em Três Pessoas — e, assim, degeneraria em alguma forma de politeísmo sobre as Três Pessoas.

Foi necessário, primeiro, que os judeus compreendessem que há um só Deus, e que só Ele pode nos salvar.

Cristo então nasce, concebido pelo Espírito Santo. Aqui vemos que Cristo não apenas nos revela que há três Pessoas na Santíssima Trindade, mas manifesta a natureza interior da Trindade por Sua própria ação de Deus. 

A revelação da Trindade por Cristo

Deus Pai envia Seu Filho, o que manifesta duas coisas:

  1. Que, se Deus vai nos ensinar sobre Si mesmo, Ele o fará por meio de Sua Palavra — que é o próprio Cristo. Deus envia o Filho, que é o conhecimento que Deus tem de Si mesmo, para nos revelar esse conhecimento.
  2. Que o envio do Filho revela a natureza do ato de geração na Trindade: já que o Pai gera o Filho, somente o Pai envia o Filho. Como o Espírito Santo não gera o Filho e, portanto, não O envia. É pelo Espírito Santo — isto é, pelo amor de Deus — que o Filho é concebido, não enviado.
“Deus amou tanto o mundo que enviou Seu Filho unigênito”.

Assim, é pelo amor de Deus, isto é, pelo Espírito Santo, que o Filho é concebido, mesmo que não enviado por Ele.

Cristo nos revela o conhecimento salvífico de Deus. Ele morre, ressuscita e ascende aos céus. Cristo diz que precisa ir ao céu para que o Paráclito, o Espírito Santo, possa ser enviado por Ele. Isso é importante porque indica que o Espírito Santo é aspirado pelo Pai e pelo Filho, não apenas pelo Pai.

Vemos que as missões das Pessoas Divinas na história da criação espelham as processões dentro da Trindade:

  • Apenas o Pai envia o Filho — portanto, o Filho é gerado somente pelo Pai.
  • O Pai e o Filho enviam o Espírito Santo em Pentecostes — portanto, o Espírito Santo é inspirado pelo Pai e pelo Filho.

No fim dos tempos, Deus Filho, que está à direita do Pai, julgará os vivos e os mortos. Isso se deve ao fato de que, sempre que alguém julga, o faz por meio do conhecimento que possui. Assim, Deus Filho, que é o conhecimento que o Pai tem de Si mesmo, julgará todos nós.

Erros graves sobre Deus

Contudo, há graves erros que muitos cometem em relação a Deus. Esses erros se dividem em duas categorias:

  1. Erros sobre a Unidade da Essência.
  2. Erros sobre a Trindade das Pessoas.

Todos os não-cristãos e os judeus estão em erro sobre a Trindade. Quanto aos judeus, embora o Deus que adoram seja o Deus de Abraão, Isaac e Jacó — isto é, o próprio Deus —, eles rejeitaram Jesus Cristo e Seus ensinamentos sobre a Trindade. Por isso, sua religião é totalmente ineficaz, pois não adoram plenamente a Deus como Ele é, e rejeitam Deus ao rejeitar o que Ele revelou sobre Si mesmo.

Quanto aos muçulmanos, eles negam que Cristo seja Deus e afirmam que Ele foi apenas um profeta. Rejeitando os ensinamentos de Cristo, eles erram sobre a natureza e os atributos de Deus. Diferente dos judeus, que ao menos compreendem corretamente certos atributos divinos (como a justiça), os muçulmanos erroneamente acreditam que os Dez Mandamentos não se aplicam aos infiéis. O deus dos muçulmanos não é o Deus que conhecemos, mas sim um deus inventado pela mente herética de Maomé — não é o Deus do catolicismo.

O fato de serem monoteístas não significa que adoram o mesmo Deus que nós. Afirmar isso é confusão mental que ignora a realidade e as distinções corretas. Como poderia o deus dos muçulmanos, que supostamente consente na matança de homens, mulheres e crianças inocentes só por não serem muçulmanos, ser o mesmo Deus que nos ensina a tratar todos como filhos de Deus, com caridade e justiça?

Os pagãos também não adoram o mesmo Deus dos católicos porque não entendem corretamente Sua natureza e atributos, nem aceitam a doutrina de que Deus é Uno e Trino. Alguns pagãos são politeístas, como os hindus — logo, não adoram o mesmo Deus que nós.

Por que isso é importante? 

Para alcançar um fim, é necessário conhecer duas coisas: o fim em si mesmo (para onde se vai) e os meios para chegar àquele fim (por onde se vai).

Santo Tomás de Aquino ensina na Suma Teológica que o fim determina os meios. Por exemplo: se quero ir para Manaus, tomarei um caminho diferente daquele que quer ir para Buenos Aires.

O mesmo se aplica à salvação. Os meios para chegar até Deus, conforme ensinou Cristo, são diferentes dos meios para alcançar o "deus" de Maomé.

Meios diferentes levam a fins diferentes. Por isso, aqueles que dizem que “existem caminhos diferentes para o mesmo Deus” estão completamente errados — a razão básica nos ensina que caminhos distintos levam a destinos distintos.

A única vez em que se pode dizer que “há diferentes caminhos para o mesmo Deus” é ao falar das diversas espiritualidades e ritos legítimos dentro do catolicismo somente. Ou seja, o único caminho estreito para Deus admite algumas pequenas variações dentro dele, mas é necessário permanecer nesse estreito caminho para chegar a Deus.

Devemos nos conformar a Deus (o fim), se quisermos ser salvos (o meio). O meio, o caminho, não depende de nós ou de como nos sentimos, mas sim do fim e dos meios que o próprio Deus estabeleceu.

Por isso, a maneira como compreendemos Deus — nossa teologia da Trindade e de Sua natureza — pode determinar nossa própria salvação.

Mantenhamo-nos sempre conformados às definições do depósito da fé sobre a Santíssima Trindade, bem expresso no Credo Atanasiano, que transcrevemos abaixo, cuja recitação é colocada no Breviário para a Festa da Santíssima Trindade.

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Credo de Santo Atanásio

1. Quem quiser salvar-se deve antes de tudo professar a fé católica.
2. Porque aquele que não a professar, integral e inviolavelmente, perecerá sem dúvida por toda a eternidade.
3. A fé católica consiste em adorar um só Deus em três Pessoas e três Pessoas em um só Deus.
4. Sem confundir as Pessoas nem separar a substância.
5. Porque uma so é a Pessoa do Pai, outra a do Filho, outra a do Espírito Santo.
6. Mas uma só é a divindade do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, igual a glória, co-eterna a majestade.
7. Tal como é o Pai, tal é o Filho, tal é o Espírito Santo.
8. O Pai é incriado, o Filho é incriado, o Espírito Santo é incriado.
9. O Pai é imenso, o Filho é imenso, o Espírito Santo é imenso.
10. O Pai é eterno, o Filho é eterno, o Espírito Santo é eterno.
11. E contudo não são três eternos, mas um só eterno.
12. Assim como não são três incriados, nem três imensos, mas um só incriado e um só imenso.
13. Da mesma maneira, o Pai é onipotente, o Filho é onipotente, o Espírito Santo é onipotente.
14. E contudo não são três onipotentes, mas um só onipotente.
15. Assim o Pai é Deus, o Filho é Deus, o Espírito Santo é Deus.
16. E contudo não são três deuses, mas um só Deus.
17. Do mesmo modo, o Pai é Senhor, o Filho é Senhor, o Espírito Santo é Senhor.
18. E contudo não são três senhores, mas um só Senhor.
19. Porque, assim como a verdade cristã nos manda confessar que cada uma das Pessoas é Deus e Senhor, do mesmo modo a religião católica nos proíbe dizer que são três deuses ou senhores.
20. O Pai não foi feito, nem gerado, nem criado por ninguém.
21. O Filho procede do Pai; não foi feito, nem criado, mas gerado.
22. O Espírito Santo não foi feito, nem criado, nem gerado, mas procede do Pai e do Filho.
23. Não há, pois, senão um só Pai, e não três Pais; um só Filho, e não três Filhos; um só Espírito Santo, e não três Espíritos Santos.
24. E nesta Trindade não há nem mais antigo nem menos antigo, nem maior nem menor, mas as três Pessoas são co-eternas e iguais entre si.
25. De sorte que, como se disse acima, em tudo se deve adorar a unidade na Trindade e a Trindade na unidade.
26. Quem, pois, quiser salvar-se, deve pensar assim a respeito da Trindade.
27. Mas, para alcançar a salvação, é necessário ainda crer firmemente na Encarnação de Nosso Senhor Jesus Cristo.
28. A pureza da nossa fé consiste, pois, em crer ainda e confessar que Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, é Deus e homem.
29. É Deus, gerado na substância do Pai desde toda a eternidade; é homem porque nasceu, no tempo, da substância da sua Mãe.
30. Deus perfeito e homem perfeito, com alma racional e carne humana.
31. Igual ao Pai segundo a divindade; menor que o Pai segundo a humanidade.
32. E embora seja Deus e homem, contudo não são dois, mas um só Cristo.
33. É um, não porque a divindade se tenha convertido em humanidade, mas porque Deus assumiu a humanidade.
34. Um, finalmente, não por confusão de substâncias, mas pela unidade da Pessoa.
35. Porque, assim como a alma racional e o corpo formam um só homem, assim também a divindade e a humanidade formam um só Cristo.
36. Ele sofreu a morte por nossa salvação, desceu aos infernos e ao terceiro dia ressuscitou dos mortos.
37. Subiu aos Céus e está sentado a direita de Deus Pai todo-poderoso, donde há de vir a julgar os vivos e os mortos.
38. E quando vier, todos os homens ressuscitarão com os seus corpos, para prestar conta dos seus atos.
39. E os que tiverem praticado o bem irão para a vida eterna, e os maus para o fogo eterno.
40. Esta é a fé católica, e quem não a professar fiel e firmemente não se poderá salvar.

Referências:

Santo Agostinho. Sobre a Trindade. Covilhã, LusoSofia Press, 2008.

Pe. Tomás Pègues. A Suma Teológica em forma de catecismo. São Paulo, Editora Taubaté, 1942.

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