"Padre, eu preciso ser perfeito! Não posso falhar de jeito nenhum!”
Quando essas palavras chegam ao confessionário, o coração de qualquer sacerdote experiente aperta, porque é fácil reconhecer onde esse pensamento vai levar: ao tormento espiritual dos escrúpulos de consciência.
Parece virtude, mas é um perigo oculto.
Na vida natural, dizem que a prática leva à perfeição.
Se você quer tocar bem um instrumento, precisa treinar todos os dias. Se quer ser um bom médico, precisa estudar muito. Se quer cozinhar bem, precisa praticar suas receitas.
Faz sentido, não faz?
Esforço + dedicação = bom resultado.
Mas aqui está o problema: essa lógica não funciona na vida espiritual.
A santidade não é uma habilidade que você necessariamente desenvolve através de muitos anos de prática religiosa e de muito esforço pessoal. A santidade é uma graça de Deus. É um dom. É algo que Deus faz em você — não algo que você fabrica sozinho com suas próprias forças.
Lembra da história da Torre de Babel? As pessoas quiseram construir uma torre tão alta que alcançasse o céu pelos próprios esforços. Deus confundiu suas línguas e dispersou aquele projeto orgulhoso.
O perfeccionismo espiritual é a mesma coisa: você quer chegar até Deus pela sua própria força. Você se exaure de rezar, de jejuar, de fazer penitências — não por amor a Deus, mas para garantir sua salvação.
O escrupuloso quer ser seu próprio salvador.
Vamos ser diretos: quando você busca a perfeição pelos próprios méritos, você não está adorando a Deus. Você está adorando a si mesmo.
Pense bem: se alguém pudesse se tornar perfeito sozinho, se a salvação dependesse apenas do esforço próprio, então não precisaríamos de Nosso Senhor Jesus Cristo. A Cruz seria desnecessária. O sacrifício de Nosso Senhor seria apenas um belo gesto, mas dispensável.
Isso é heresia na prática. É pelagianismo — a antiga heresia que diz que o homem pode se salvar sem a graça divina.
Como você sabe que está caindo nessa armadilha?
- Você nunca está satisfeito com suas orações. Reza o terço e acha que não rezou direito. Repete. E repete de novo. Às vezes, leva 30 minutos para rezar três Ave-Marias porque fica repetindo cada palavra.
- Você vive com medo de ter cometido algum pecado sem perceber. Passa o dia inteiro repassando mentalmente tudo que fez, disse e pensou, procurando alguma falha.
- Sua confissão é uma lista interminável. Leva cadernos cheios de anotações. Quer confessar coisas da infância. Repete confissões porque acha que "não confessou direito".
- Você quase nunca comunga. Sempre acha que não está digno, que cometeu algum pecado mortal, que precisa se confessar de novo.
- Sua vida espiritual não traz paz, mas angústia. A oração é um peso. A missa é fonte de ansiedade. A confissão é tortura.
Martinho Lutero é o exemplo histórico perfeito dessa tragédia espiritual.
Ele era um monge agostiniano extremamente dedicado às práticas de piedade. Rezava por horas. Jejuava rigorosamente. Fazia penitências severas. Confessava-se todos os dias — às vezes várias vezes por dia.
Mas vivia atormentado. Achava que nunca obtinha o perdão de Deus. Por mais que confessasse, sempre achava que havia esquecido algum pecado. Vivia com medo terrível de ser condenado ao inferno.
O que aconteceu? Em vez de buscar ajuda adequada, em vez de encontrar um bom diretor espiritual que o ensinasse o verdadeiro caminho da santidade, Lutero foi para o extremo oposto.
Abandonou a vida religiosa. Rejeitou a confissão. Criou uma nova doutrina que negava o livre-arbítrio e dizia que as obras não importam. Criou o protestantismo.
Foi dos escrúpulos para o relaxamento total. Da neurose perfeccionista para a negação da Fé e da Moral Católicas.
Como saber se algo é pecado grave ou não? Como formar corretamente a consciência? O critério não é uma lista técnica de regras complicadas. O critério é simples: o amor.
Os Dez Mandamentos não são leis frias e arbitrárias. São expressões do amor divino. Cada mandamento tem um princípio de amor por trás.
Quando você falha gravemente contra esse amor — de forma consciente, livre e deliberada — aí sim, há pecado mortal.
Mas o escrupuloso não entende isso. Ele transforma tudo em regra técnica. Perde de vista o amor e fica preso em detalhes insignificantes.
Deus não quer robôs perfeitos. Ele quer filhos que O amem livremente.
Ele sabe que você é fraco. Ele sabe que você pode cair. Ele sabe que você não é perfeito, mas Ele te ama assim mesmo — infinitamente, incondicionalmente, eternamente.
O que Ele quer não é que você nunca erre; o que Ele quer é que você confie n'Ele. Que você se levante quando cair. Que você aceite Sua misericórdia com humildade.
Santa Teresinha entendeu isso perfeitamente. Ela descobriu a "pequena via" da infância espiritual: confiar em Deus como uma criança confia no Pai, sabendo que sozinha não consegue nada, mas que nos braços do Pai está completamente segura.
Se você está preso nessa armadilha do perfeccionismo, precisa tomar uma decisão: desistir de ser seu próprio salvador.
Pare de tentar construir sua torre de Babel espiritual. Pare de querer merecer o céu por seus próprios esforços. Pare de tratar Deus como um chefe exigente que você precisa impressionar.
Aceite que você é pequeno, fraco, limitado — e que está tudo bem. Sua salvação não depende de só você; ela dependeu principalmente de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Procure um bom diretor espiritual. Obedeça ao que ele disser, mesmo quando sua consciência escrupulosa gritar o contrário. Aprenda a confiar mais em Deus e menos em suas próprias forças.
O perigo oculto de querer ser perfeito para Deus é achar que você pode fazer isso sozinho. A verdade libertadora é que você não pode — e não precisa fazer tudo sozinho: Cristo já fez o principal por você.
Basta aceitar, com humildade e gratidão, o dom da Sua graça.
Pe. L. Grimes. Tratado dos Escrúpulos. Petrópolis: Editora Vozes, 1952.