Neste dia 10 de setembro, dia do trânsito de São Nicolau de Tolentino, celebramos sua festa litúrgica. Para os santos, o dia a ser celebrado é o dia de sua morte, quando recebem a coroa e o prêmio de seus trabalhos aqui na terra.
Pelo pecado original, todos nascemos privados da graça de Deus; nascemos com uma inclinação ao mal; nascemos com o intelecto obscurecido e uma vontade débil.
Ser santo, portanto, não é uma tarefa fácil, pois precisamos lutar com e vencer o pior dos inimigos: nós mesmos. O mundo tem suas seduções, mas podemos lançar mão de artifícios para o evitar ou até para sair dele. O demônio não pode nos obrigar a nada… é um cão acorrentado.
Não é possível escapar, contudo, de nós mesmos. Assim, considerando as consequências do pecado original em nós, podemos concluir que somos nossos mais terríveis inimigos.
Para vencer-se a si mesmo, adotou São Nicolau um profundo espírito de mortificação. Escreveu sobre ele o Padre João Batista Lehmann:
“Em si, reconhecia o elemento mais inútil da Ordem [dos Eremitas de Santo Agostinho]. Cumprir a vontade dos outros era-lhe o maior prazer, pois assim se lhe dava ocasião de mortificar a sua. Levou a mansidão a tal ponto de perfeição, que as maiores contrariedades não conseguiam perturbá-lo ou fazê-lo perder a paciência.”
Ele não é dos santos mais conhecidos. Foi um frade agostiniano do final do século XIII e início do século XIV que foi concebido como resposta a uma oração: seus pais foram a um santuário de São Nicolau de Mira (em Bari, na Itália) e pediram a graça de ter um filho.
Em 1245, nasceu um menino, a quem deram o nome de Nicolau, em honra a seu intercessor. Sua família era pobre — não miserável, mas humilde —, e isso muitas vezes favorece quem deseja seguir a vida religiosa.
Aos 16 anos, Nicolau entrou para os eremitas de Santo Agostinho. Muitas vezes, nas vidas dos santos, vemos famílias nobres ou ricas se oporem à vocação religiosa de seus filhos por causa do prestígio e da herança. A riqueza se torna, assim, um obstáculo ao Evangelho — algo que o próprio Cristo previu. No caso de Nicolau, não houve impedimento: ele pôde entregar-se totalmente a Deus.
Ele dedicava longas horas à oração, fazia jejuns e penitências, dedicando também tempo aos estudos para o sacerdócio. Depois de 9 anos como frade, foi ordenado padre.
Logo ganhou reputação de bom pregador e confessor, conhecido também por sua mansidão. Por isso, foi encarregado de distribuir alimento e esmolas no portão do mosteiro. Todos os dias, muitos pobres batiam à porta, e ele lhes entregava pão ou o que fosse possível. Ainda hoje há a tradição do “pão de São Nicolau”.
Certo dia, após longos jejuns, Nicolau estava fraco e doente. Teve então uma visão da Santíssima Virgem, de Santo Agostinho e de Santa Mônica, que lhe pediram que comesse um pão bento, marcado com o sinal da cruz e molhado em água.
Ele obedeceu e logo recuperou as forças. A partir daí, passou a distribuir esse pão bento aos doentes, que também alcançavam curas. Muitos testemunhavam melhoras, e o fato atraiu tanta gente que o prior chegou a acusá-lo de gastar demais os recursos do mosteiro.
“Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.” (Mt 5,9).
Depois de 18 anos no mosteiro, São Nicolau começou a ouvir vozes angelicais que o diziam: “Tolentino, Tolentino!”.
Na época, Tolentino era uma cidade marcada por violentas disputas entre duas facções rivais: guelfos (apoiadores do Papa) e gibelinos (apoiadores do Imperador).
Havia mortes, vinganças e intrigas. Movido pelo chamado de Deus, Nicolau mudou-se para lá a fim de ser instrumento de paz.
Assim como São Francisco de Assis e, mais tarde, Santa Catarina de Sena e São Bernardino de Sena, Nicolau buscou reconciliar essas famílias em conflito. Seu trabalho baseava-se em três atividades principais:
Conta-se também um episódio milagroso em que certa vez, serviram-lhe carne por engano. Ao fazer o sinal da cruz sobre o alimento, a ave voltou à vida e voou pela janela!
São Nicolau de Tolentino é o padroeiro das almas do purgatório. Ele tinha grande devoção por elas e celebrava Missas em seu sufrágio.
Uma vez, um frade falecido lhe apareceu pedindo Missas por sua alma. Nicolau ofereceu por ele sete Missas, após as quais teve uma nova visão: aquele frade e muitas outras almas haviam alcançado o Céu.
Diz-se que o demônio, irritado com o bem que Nicolau realizava, chegou a agredi-lo fisicamente com uma vara. Assim como ocorreu com outros santos, quando o inimigo não consegue vencer pela tentação, recorre à violência infantil, como quem tem um ataque de fúria.
São Nicolau morreu em Tolentino no ano de 1305, aos 60 anos de idade.
De sua vida, tiramos algumas lições: Ele nasceu pobre e viveu pobre, sem os obstáculos da riqueza para seguir Nosso Senhor. Viveu sempre na penitência e na austeridade, lembrando-nos de que nós, no conforto moderno, muitas vezes estamos mais afastados de Deus justamente pelos excessos e facilidades. Nicolau uniu oração e trabalho: rezava, fazia penitência, ajudava os pobres, pregava, intercedia pelos mortos e buscava reconciliar os inimigos.
Peçamos, pois, sua intercessão. Que possamos, como ele, abraçar a austeridade, a penitência e praticar a caridade aos vivos e aos mortos.
Pe. Alban Butler. The Lives of the Saints, Benziger Bros, 1894.
Pe. João Batista Lehmann. Na luz perpétua. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 1953.