Afonso X, conhecido como “El Sabio”, nasceu em Toledo no ano de 1221, filho de Fernando III de Castela e Beatriz de Suábia.
No contexto da Reconquista da Península Ibérica por parte dos católicos sobre os muçulmanos, Afonso X tornou-se Rei de Castela e Leão em 1252.
Ele reuniu muitos intelectuais em sua corte, legando uma grande contribuição para o direito, a história, a ciência e a música. Em um artigo passado, contamos como Guido d’Arezzo (c. 991–c. 1033) propôs o uso de linhas para fixar a altura das notas em uma melodia — sistema que usamos até hoje, com algumas melhorias.
Afonso X compôs (parte das) 427 Cantigas de Santa Maria, que são um grande cancioneiro medieval em honra de Maria Santíssima.
Divide-se em dois grupos: cantigas de louvor (cantigas de loor) e cantigas de milagre (cantigas de miragre). Cada cantiga está acompanhada de notação musical em tetragrama medieval (contribuição de Guido), o que possibilita uma reprodução muito fiel quase 800 anos depois.
A Cantiga 56 de Santa Maria é uma cantiga de milagre, e conta como Nossa Senhora fez nascer 5 rosas na boca de um monge após sua morte, o qual, em honra das 5 letras do nome de Maria, rezava 5 salmos todos os dias.
Abaixo, a cantiga completa, em tradução livre para a língua portuguesa moderna:
Grande é o direito de ser
seu milagre tão formoso:
da Virgem quis nascer
por nós o Deus glorioso.
Quero, pois, aqui contar
um milagre que escutei,
do qual prazer hão de tomar
os que o ouvirem, eu bem sei;
e poderão, assim, notar
o grande bem que encontrei:
a Virgem foi abençoar
um monge muito piedoso.
Grande é o direito de ser […]
Pouco sabia ele ler,
como ouvi eu contar,
mas sabia bem querer
à Virgem sem igual no amar;
e por isso foi compor
cinco salmos, e ajuntar,
para a sua honra crescer,
que desejava exaltar.
Grande é o direito de ser […]
Dos salmos veio escolher
cinco, por justa razão,
e pô-los cada qual a corresponder
às cinco letras que estão
em “Maria”, para receber
dela depois galardão,
e poder também merecer
do seu Filho, o mais bondoso.
Grande é o direito de ser […]
Quem ler e for buscar
estes salmos, logo vê:
o “Magnificat” está lá,
e “Ad Dominum” também é;
ao fim o “In convertendo”
e o “Ad te” logo se lê;
depois “Retribue servo tuo”
humilde se acha na fé.
Grande é o direito de ser […]
E por bem de Deus ganhar,
esses salmos sem cessar
cada dia ia rezar
diante do altar sagrado,
e sempre a se confessar
do que tinha de errado,
pois queria merecer
o perdão do Deus bondoso.
Grande é o direito de ser […]
Esse costume conservou
enquanto neste mundo viveu;
mas depois, quando expirou,
em sua boca apareceu
um rosal, que mostrou
cinco rosas — e cresceu
porque sempre a louvou
a Mãe do Deus Poderoso.
Grande é o direito de ser
seu milagre tão formoso:
da Virgem quis nascer
por nós o Deus glorioso.
Esse monge rezava cinco salmos em honra das cinco letras do nome de nossa Mãe do Céu.
Deixamos abaixo os referidos salmos, em ordem, para aqueles que desejarem imitar o monge.
Lucas 1, 46-55
Magnificat anima mea Dominum,
et exsultavit spiritus meus in Deo salutari meo,
quia respexit humilitatem ancillae suae: ecce enim ex hoc beatam me dicent omnes generationes,
quia fecit mihi magna qui potens est, et sanctum nomen eius,
et misericordia eius a progenie in progenies timentibus eum.
Fecit potentiam in brachio suo, dispersit superbos mente cordis sui.
Deposuit potentes de sede, et exaltavit humiles.
Esurientes implevit bonis, et divites dimisit inanes.
Suscepit Israel puerum suum, recordatus misericordiae suae,
sicut locutus est ad patres nostros, Abraham et semini eius in saecula.
Psalmus 119
Ad Dominum cum tribularer clamavi: et exaudivit me.
2 Domine, libera animam meam a labiis iniquis, et a lingua dolosa.
3 Quid detur tibi, aut quid apponatur tibi ad linguam dolosam?
4 Sagittae potentis acutae, cum carbonibus desolatoriis.
5 Heu mihi! quia incolatus meus prolongatus est: habitavi cum habitantibus Cedar:
6 multum incola fuit anima mea.
7 Cum his, qui oderunt pacem, eram pacificus: cum loquebar illis, impugnabant me gratis.
Psalmus 118
Retribue servo tuo, vivifica me: et custodiam sermones tuos.
18 Revela oculos meos: et considerabo mirabilia de lege tua.
19 Incola ego sum in terra: non abscondas a me mandata tua.
20 Concupivit anima mea desiderare justificationes tuas in omni tempore.
21 Increpasti superbos: maledicti qui declinant a mandatis tuis.
22 Aufer a me opprobrium, et contemptum: quia testimonia tua exquisivi.
23 Etenim sederunt principes, et adversum me loquebantur: servus autem tuus exercebatur in justificationibus tuis.
24 Nam et testimonia tua meditatio mea est: et consilium meum justificationes tuae.
Psalmus 125
In convertendo Dominus captivitatem Sion: facti sumus sicut consolati.
2 Tunc repletum est gaudio os nostrum: et lingua nostra exsultatione.
3 Tunc dicent inter gentes: Magnificavit Dominus facere cum eis.
4 Magnificavit Dominus facere nobiscum: facti sumus laetantes.
5 Converte, Domine, captivitatem nostram, sicut torrens in austro.
6 Qui seminant in lacrymis, in exsultatione metent.
7 Euntes ibant et flebant, mittentes semina sua.
8 Venientes autem venient cum exsultatione, portantes manipulos suos.
Psalmus 122
Ad te levavi oculos meos, qui habitas in cælis.
2 Ecce sicut oculi servorum in manibus dominorum suorum,
sicut oculi ancillæ in manibus dominæ suæ:
ita oculi nostri ad Dominum Deum nostrum, donec misereatur nostri.
3 Miserere nostri, Domine, miserere nostri:
quia multum repleti sumus despectione.
4 Quia multum repleta est anima nostra:
opprobrium abundantibus, et despectio superbis.
São Jerônimo, Santo Epifânio e Santo Antonino declaram com autoridade que o nome de Maria desceu dos céus e foi imposto por prescrição divina.
Ricardo de São Lourenço afirma que a Santíssima Trindade dotou de tal poder esse nome que todos, prostrados, o veneram no céu, na terra e no inferno; e que ele sozinho basta para curar todos os males, pois não há enfermidade tão maligna que não ceda imediatamente à força desse nome.
Santo Afonso garante que todos os que invocam este nome com devoção experimentam uma doçura salutar de conforto, amor, alegria, confiança e fortaleza.
Nossa Senhora revelou à Santa Brígida que os anjos bons se aproximam ainda mais das almas justas que devotamente pronunciam o seu nome; e Tomás de Kempis escreveu que os demônios temem de tal maneira o nome de Maria que fogem de quem o pronuncia como um fogo a queimá-los.
São Pedro Crisólogo garante que quem nas dúvidas quanto a haver pecado nas tentações à pureza se lembra de haver invocado o nome de Maria, tem nisto um indício seguro de que não ofendeu a castidade.
Conclui Santo Afonso:
“Roguemos, pois, meu devoto leitor, roguemos a Deus para que nos conceda esta graça, que a última palavra da nossa língua na hora da morte seja o nome de Maria”.
Amém.
Santo Afonso Maria de Ligório. Glórias de Maria. 39. ed. Aparecida: Editora Santuário, 2018.
