Escrúpulos
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24.10.2025

A armadilha que fez Lutero sair da Igreja

PL
Equipe do Padre Leonardo
Formação Católica

Martinho Lutero é um dos personagens mais controversos da história da Igreja. Fundador do protestantismo, foi ele responsável por uma cisão que dividiu a cristandade e cujos efeitos sentimos até hoje. 

O que poucos sabem é que Lutero não começou como um herege rebelde. Ele começou como um católico fervoroso — e fervoroso até demais. 

Foi justamente esse fervor mal direcionado que o levou à tragédia espiritual. A armadilha que destruiu Lutero tem um nome: escrúpulos de consciência

O jovem Lutero: um católico atormentado 

Martinho Lutero nasceu em 1483 na Alemanha. Estudou direito, mas após uma experiência traumática (alguns dizem que quase foi atingido por um raio, mas outros dizem que matou seu melhor amigo em um duelo), decidiu entrar para a vida religiosa — se foi o primeiro caso, por medo da condenação eterna; se foi o segundo, por medo da condenação civil.

Em 1505, tornou-se um monge agostiniano. E que monge fervoroso ele parecia ser! 

Lutero rezava por horas a fio. Fazia jejuns rigorosos. Praticava penitências severas. Confessava-se todos os dias — às vezes várias vezes por dia. 

Mas ele nunca sentia paz. 

A confissão interminável

Os biógrafos de Lutero contam que ele podia passar até seis horas seguidas no confessionário. Seu confessor, Pe. João von Staupitz, ficava exausto. 

Por quê tanto tempo? Porque Lutero queria confessar absolutamente tudo. Cada pensamento, cada pequena falha, cada imperfeição. Ele repassava mentalmente toda sua vida, procurando pecados que pudesse ter esquecido. 

Sempre achava algo… sempre!

Quando terminava a confissão, saía do confessionário, mas poucos minutos depois, voltava: 

Padre, esqueci de confessar algo!

Lutero vivia atormentado pelo medo de ser condenado ao inferno. Não importava quantas vezes confessasse, não importava quantas penitências fizesse: ele nunca sentia que havia obtido o perdão de Deus. 

Na cabeça dele, Deus era um juiz severo, implacável, impossível de agradar. Um Deus que estava constantemente procurando razão para condená-lo. 

Lutero chegou a dizer: 

Eu não amava a Deus; na verdade, eu O odiava.

Por quê? Porque via Deus como um tirano cruel, não como um Pai amoroso.

Quando rezava a Missa, tremia de angústia ao pronunciar as primeiras palavras do cânon, que fazem o sacerdote se dirigir a Deus como um “Pai clementíssimo”.

O diagnóstico: escrúpulos graves 

O que Lutero tinha, em termos técnicos, eram escrúpulos de consciência em grau severo. Todos os sintomas estavam presentes: 

●  Confissões repetidas e intermináveis: Nunca achava que tinha confessado direito;

●  Medo constante de condenação: Vivia obcecado com o inferno;

●  Perfeccionismo neurótico: Achava que precisava ser perfeito em tudo para conseguir agradar a Deus;

●  Incapacidade de sentir paz: Não importava o que fizesse, a angústia não passava;

●  Imagem distorcida de Deus: Via Deus como juiz cruel, não como Pai misericordioso.

Lutero precisava de ajuda. Precisava de um bom diretor espiritual que o ensinasse sobre a misericórdia divina, sobre a verdadeira natureza de Deus, sobre como formar corretamente a consciência. 

A solução de Lutero: relaxamento total

Em vez de buscar a solução correta, Lutero tomou o caminho errado. 

Cansado de tentar agradar a Deus pelos próprios esforços, cansado de nunca sentir paz, ele foi para o extremo oposto. 

Se antes achava que tudo era pecado, agora passou a negar a gravidade do pecado. Se antes achava que precisava se esforçar demais, agora passou a dizer que as obras não importam. Se antes vivia obcecado com a confissão, agora rejeitou o sacramento. 

Para resolver seus escrúpulos, Lutero criou doutrinas novas:

1. Sola Fide (Só a Fé): Segundo Lutero, só a fé salva. As obras não importam. A confissão não importa. Basta crer e você está salvo, não importa o que faça.

2. Negação do livre-arbítrio: Lutero passou a ensinar que o homem não tem livre-arbítrio. Todos são predestinados. Se você está condenado, não há nada que possa fazer.

3. Rejeição da confissão: Já que não conseguia confessar "direito", Lutero simplesmente aboliu a confissão sacramental.

4. Sacerdócio universal: Todos são sacerdotes, não há hierarquia. Cada um interpreta a Escritura por si mesmo.

Em 1525, Lutero abandonou completamente os votos religiosos e casou-se com Catarina von Bora, uma ex-freira. 

Não foi um casamento por amor no início — foi mais uma declaração de ruptura total com a vida religiosa que ele via como opressora. 

A tragédia de Lutero não foi ter escrúpulos. Muitos santos tiveram escrúpulos em algum momento da vida: Santa Teresinha do Menino Jesus; São Francisco de Sales; Santo Inácio de Loyola; Santa Margarida Maria Alacoque…

A diferença é que esses santos superaram os escrúpulos da maneira correta. Já Lutero, não. 

O que os santos fizeram

Buscaram orientação adequada: Tiveram diretores espirituais sábios que os guiaram no caminho certo.

Obedeceram mesmo quando a consciência gritava o contrário: Aceitaram que sua consciência estava defeituosa e precisava ser corrigida.

Aprenderam sobre a misericórdia divina: Aceitaram que Deus é Pai, não algoz. Que Ele ama infinitamente, que perdoa plenamente.

Confiaram na graça, não nas próprias forças: Entenderam que a santidade é dom de Deus, não conquista humana.

Perseveraram na Igreja: Mesmo nas dificuldades, permaneceram fiéis à doutrina católica. 

O que Lutero fez

Rejeitou a orientação que recebia: Quando seu confessor dizia "isso não é pecado", ele não acreditava. Procurava soluções por conta própria.

Confiou mais na própria consciência defeituosa: Achou que entendia melhor que os teólogos e doutores da Igreja.

Criou um "deus" à sua imagem: Em vez de conhecer o Deus verdadeiro, criou doutrinas que se encaixavam em sua mente perturbada.

Foi do extremo ao extremo: Do perfeccionismo neurótico ao relaxamento total. Da rigidez excessiva à negação da moral.

Abandonou a Igreja: Em lugar de se curar dentro dela, criou uma nova "assembleia" moldada às suas ideias.


As consequências 

As doutrinas de Lutero não resolveram seus escrúpulos — apenas os trocaram por outro problema. Ele passou a vida angustiado de outras formas: 

●  Tinha crises de desespero, achando que estava predestinado à condenação;

●  Sofria de depressão profunda;

●  Tinha visões diabólicas;

●  Suicidou-se sem esperanças da própria salvação.


E pior: suas doutrinas contaminaram milhões de pessoas. O protestantismo se espalhou e se espalha até hoje, dividindo a cristandade, gerando guerras religiosas e confusão doutrinária.

Tudo isso porque um homem com escrúpulos graves não buscou a cura no lugar certo.


A lição para nós

A história de Lutero é um aviso solene para todos que sofrem de escrúpulos:

Não tente resolver o problema sozinho. Você precisa de ajuda. De um bom confessor, de um diretor espiritual experiente e fiel à doutrina da Igreja.

Não vá do extremo ao extremo. A solução para os escrúpulos não é o relaxamento moral. É formar corretamente a consciência.

Não abandone a Igreja. Mesmo que sua experiência pessoal seja difícil, a doutrina da Igreja é verdadeira. O problema não está nela, está na sua consciência defeituosa.

Aprenda quem Deus realmente é. Ele não é o tirano que sua mente escrupulosa inventou. Ele é Pai. Ele é misericórdia. Ele é amor.

Confie na graça, não em suas forças. Você nunca será perfeito por esforço próprio. E não precisa ser. Cristo já fez tudo por você.

A Igreja Católica sempre ensinou o equilíbrio perfeito: Sim, o pecado é real e pode custar nossa salvação. Não podemos ser relaxados.

Sim, precisamos nos esforçar na vida espiritual. As obras importam, a confissão importa, a oração importa.

Mas tudo isso só tem valor pela graça de Deus. Sem Ele, nada podemos. Com Ele, tudo é possível. Deus é infinitamente misericordioso. Ele conhece nossas fraquezas. Ele não espera perfeição, espera confiança filial.

Lutero poderia ter sido um grande santo. Tinha fervor, dedicação, desejo sincero de agradar a Deus.

Mas caiu na armadilha dos escrúpulos mal resolvidos. Em lugar de buscar a cura na Igreja, abandonou-a e criou algo novo. 

Não cometa o mesmo erro. 

Se você sofre de escrúpulos, há esperança. Há cura. Há um caminho seguro dentro da Igreja Católica, percorrido por inúmeros santos que passaram pelo mesmo que você passa. 

Mas você precisa escolher: vai buscar a cura no lugar certo, ou vai tentar inventar suas próprias soluções? 

A diferença entre Lutero e os santos foi essa escolha. Escolha bem. 

Referências:

Pe. L. Grimes. Tratado dos Escrúpulos. Petrópolis: Editora Vozes, 1952.

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