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Atualidades
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October 16, 2025

Quando as igrejas se tornam boates: a perda da Fé na Europa

Equipe do Padre Leonardo Wagner

A descristianização da Europa não é apenas uma estatística nos relatórios sociológicos — ela tem endereço, arquitetura e história. 

Em cidades como Berlim, Amsterdã, Londres e Bochum, maravilhosas igrejas, erguidas com o suor e a fé de gerações, hoje abrigam atividades que seus construtores jamais poderiam imaginar. O fenômeno das igrejas convertidas em espaços profanos revela uma crise espiritual sem precedentes na história do Ocidente.

A profanação do sagrado

O que está acontecendo na Europa desafia a compreensão de quem ainda possui o sentido do sagrado. Igrejas multicentenárias, consagradas a Deus e dedicadas ao Seu Culto, estão sendo sistematicamente convertidas em estabelecimentos comerciais e espaços de entretenimento.

Na Alemanha, uma igreja em Bad Orb foi transformada em centro de escalada — os fiéis que antes se ajoelhavam em oração agora são substituídos por jovens que escalam paredes onde havia as imagens dos santos. Você leu corretamente: um lugar de escalada!

Em Limburg, a histórica Kapelle auf dem Schafsberg virou restaurante, com seus vitrais iluminando não mais a celebração eucarística, mas pratos sofisticados servidos onde antes estava o altar!

A situação é igualmente grave em outros países. Na Espanha, uma igreja centenária ganhou grafites coloridos e foi convertida em pista de skate

Na Holanda, dezenas de igrejas foram transformadas em livrarias, museus, academias e até hotéis de luxo. A ironia é cruel: em Maastricht, uma igreja dominicana do século XIII abriga hoje uma livraria que vende, entre outros títulos, livros que atacam o próprio catolicismo — e uma cafeteria funciona exatamente onde ficava o altar.

O caso mais grave: a transformação das igrejas em mesquitas

Se a conversão de igrejas em espaços comerciais já é alarmante, há algo ainda mais preocupante: a transformação de templos católicos em mesquitas

Em Amsterdã, a antiga igreja jesuíta que hoje é a Mesquita de Fatih ilustra perfeitamente essa realidade. Os novos proprietários muçulmanos mantiveram a estrutura arquitetônica do edifício, mas substituíram as cruzes por meias-luas islâmicas, e onde antes se celebrava a Santa Missa voltada para o Oriente (símbolo de Cristo, Sol da Justiça), agora se “reza” voltado para Meca.

Este não é um caso isolado. A Holanda fecha uma igreja por semana, segundo dados da Reuters. Enquanto isso, a população muçulmana do país cresce exponencialmente. Relatórios do Pew Research Center indicam que a islamização da Europa continuará aumentando nas próximas décadas, mesmo sem uma nova migração em massa.

A dimensão do colapso

Os números revelam a gravidade da situação. Enquanto o Brasil tem apenas 9% da população sem religião declarada (segundo o IBGE), na Holanda esse percentual chega a impressionantes 58%. Em 1970, mais de 90% dos europeus se identificavam como cristãos; hoje, em vários países, esse número despencou para menos da metade.

A Alemanha enfrenta uma situação particularmente dramática. Em 2022, mais de meio milhão de alemães abandonaram formalmente o cristianismo — um recorde histórico. O país perdeu milhões de fiéis nas últimas décadas, e a tendência continua acelerada. Globalmente, a proporção de cristãos na população mundial caiu de 31% para 29%, enquanto quase um quarto da humanidade hoje se declara sem religião alguma.

As causas do abandono

Diversos fatores contribuem para essa apostasia coletiva. Na Alemanha, o governo cobra o Kirchensteuer, um imposto de aproximadamente 9% sobre a renda de quem se registra como católico ou protestante. Curiosamente, ortodoxos e muçulmanos estão isentos dessa taxa, criando um incentivo perverso ao abandono formal da fé cristã. A Conferência Episcopal Alemã chegou a negar sacramentos a quem se desfiliasse para evitar o tributo, medida que gerou escândalo e críticas, mas não reverteu a sangria de fiéis.

Além disso, manter um templo na Europa custa caro: estima-se que cada igreja alemã demande cerca de 26 mil euros anuais em manutenção. Sem fiéis e sem recursos, muitas dioceses optam por vender ou alugar os edifícios, que acabam servindo a propósitos completamente alheios à sua vocação original.

Mas a raiz do problema é muito mais profunda que questões econômicas ou tributárias. A Europa atravessa uma crise espiritual devastadora, fruto de décadas de secularismo militante, relativismo moral e abandono deliberado das tradições cristãs que moldaram sua civilização.

O contraste com o catolicismo que floresce em outros lugares

Enquanto a Europa se esvazia de sua fé milenar, outros continentes experimentam um despertar religioso. Nos Estados Unidos, há um crescimento expressivo de jovens católicos e comunidades tradicionais, com dioceses relatando missas significativamente mais cheias. 

Na África subsaariana, o catolicismo se expande com vigor impressionante, e projeções indicam que o continente africano será, em breve, o principal centro demográfico da cristandade mundial.

Na América Latina e em partes da Ásia — justamente onde missionários jesuítas, franciscanos e dominicanos pregaram o Evangelho há séculos — a fé católica permanece viva e atuante. No Brasil, apesar dos desafios do secularismo e do crescimento de religiões alternativas, a herança católica ainda marca profundamente a cultura e a identidade nacional.

A promessa que permanece

Santo Irineu de Lyon, que viveu no século II e foi discípulo de São Policarpo (que por sua vez foi discípulo direto do Apóstolo João), escreveu sobre a sucessão apostólica e a continuidade ininterrupta da fé desde Cristo até seus dias. Ele documentou como a Igreja em Roma, fundada pelos Apóstolos Pedro e Paulo, preservava intacta a doutrina recebida do próprio Senhor.

Essa mesma doutrina — não modificada, mas apenas aprofundada e melhor compreendida ao longo dos séculos — permanece hoje na Igreja Católica. Como ensinou o Concílio Vaticano I, citando São Vicente de Lérins, o desenvolvimento doutrinário se dá sempre "no mesmo sentido e na mesma sentença", sem rupturas ou contradições com o depósito da fé apostólica.

Cristo prometeu a São Pedro: "Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela" (Mt 16,18). Esta promessa não falhou — e não falhará. 

A Igreja pode ser perseguida, pode ver seus templos profanados ou abandonados, pode enfrentar crises terríveis. Mas ela permanecerá, porque foi fundada não por homens, mas pelo próprio Filho de Deus.

Um alerta para nossos dias

As igrejas-boates, igrejas-bares e igrejas-mesquitas da Europa não são apenas curiosidades jornalísticas ou problemas distantes. São sinais proféticos do que acontece quando uma civilização rejeita suas raízes espirituais e trata o sagrado como mera herança cultural, passível de ser comercializada ou descartada conforme a conveniência.

Para nós, brasileiros, esses exemplos devem servir de alerta. Não podemos dar por garantida nossa fé ou imaginar que a descristianização europeia jamais nos alcançará. O secularismo, o materialismo e o relativismo moral avançam também em nossa terra. Cabe a cada geração transmitir fielmente a fé recebida, defender a sacralidade dos espaços consagrados a Deus e formar novos discípulos missionários que mantenham acesa a chama do Evangelho.

Os sinos que ainda tocam em nossas cidades, as procissões que enchem nossas ruas, os santuários que acolhem milhões de peregrinos, tudo isso não é acidental: é fruto de séculos de evangelização, sacrifício e fidelidade. Que saibamos honrar essa herança e transmiti-la intacta às futuras gerações, para que jamais precisemos ver nossas igrejas transformadas em casas de entretenimento mundano ou entregues a falsas religiões.

A Europa nos ensina, pelo negativo, a lição mais importante: uma civilização que abandona Cristo perde sua própria alma.

Referências:

Reuben Parsons. Studies in Church History, 6 v. Philadelphia: John Joseph McVey, 1886.

Santo Irineu de Lyon. Contra as Heresias, Livro 3.

Pew Research Center. Relatórios sobre população religiosa global e islamização europeia.

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